Carlito Contini busca o ponto de fuga. Aproxima-se da tela para nos afastar. Cria jogo óptico com a pintura plana, que promete um fim nunca alcançado.
A série apresentada na Estação Pinacoteca conclui processo interrompido. Este projeto teve início com “On”, em 1995. Onze anos depois, o artista fecha o ciclo com díptico de 2006. No intervalo, a produção foi intercalada com estadia na Espanha e impressão de módulos planos com trama geométrica.
Desde “On”, desenha-se o problema da perspectiva. A obra simula vista ascendente de teto em caixote, facetado em oito trapézios. Os círculos, que se alinham nos lados, progridem concentricamente, convergindo o olhar para o meio octogonal. Noutra tela da série, iniciada em 1997, um leão ocupa nicho escuro retangular.
Os dezoito meses de residência em Madri levaram Carlito Contini ao contato com a herança dos simples geométricos. Criou seqüência de peças retangulares, montadas sobre painéis, cujo padrão repete os círculos do leão com a mesma ordenação linear, causando efeito convergente. Porém o retângulo central é vazio.
Seguiu-se a retomada da série de pinturas. As obras recolocam o problema da figura no nicho interno da composição.
Resulta repertório de seres hieráticos: anjos, leão, cavalos, pássaro. Posicionam-se contra fundo escuro, enegrecendo o horizonte. Encobrem o lugar de encontro das linhas, projetado pela extensão imaginária das retas, interrompidas pelas divisórias, que enquadram cada personagem.
A pintura lisa explora a luminosidade das tênues velaturas. A escala tonal dos círculos marginais projeta luz contra negrume predominante. Tira proveito dos ângulos retos do chassi.
A representação do centro é buscada e ausente. A perspectiva de fato converge para um ponto dentro do campo pictórico. Mas o meio é velado por alegorias. A disposição do ciclo no amplo espaço expositivo enfatiza o efeito cenográfico, permitindo-se ao espectador ter recuo suficiente para atingir o olho do príncipe, posição de onde melhor se visualiza o resultado ilusionista. Mas, em contrapartida, no foco da tela, só se vê enigma.
Na última década, nossa percepção de centro global é fortalecida, mas permanece obscura a natureza da periferia: múltipla ou homogênea? Carlito Contini confere ordem e rigor à margem, mergulhando o meio em dúvida. O ciclo instalado traz à Estação Pinacoteca uma reflexão rigorosa sobre as recentes estruturas de contraste entre centro e entorno.